terça-feira, 1 de maio de 2012

EU, EU e EU! de Regina Célia Vieira


Tema: Mistério!



Personagens:


Jéssica e Jorge

Jéssica- Cadê?

Jorge- O que?

Jéssica- O meu anel de formatura!

Jorge- E eu sei lá?

Jéssica- Eu coloquei na caixa de jóias ontem, antes de dormir, e agora não está mais!

Jorge- Tem que estar aí! Eu não mexi! Se você deixou aí, aí tem que estar.

Jéssica- Eu deixei. Mas cadê? Evaporou? Eu quero meu anel!

Jorge- Eu não posso fazer nada! O máximo que eu posso fazer é procurar com você!

Jéssica- Pra que eu vou perder meu tempo procurando algo que eu sei que deixei no lugar?

Jorge- Mas se não está mais nesse lugar, só pode estar em outro.

Jéssica- Só se você pegou?

Jorge- Eu já disse que não peguei coisa alguma! Pra que eu iria pegar o seu anel de formatura? Um anel horroro daquele! E o meu dedo é muito grosso para usá-lo.

Jéssica- Não se faça de besta!  Você pode ter pego pra vender.

Jorge- Você está louca, Jéssica?  E eu lá preciso vender anel de alguém?  Pra que?  Pra comprar crack?  Você não pode me acusar!  Sou seu, marido! Isto é um absurdo!  Tal pensamento jamais poderia ter passado pela sua cabeça!

Jéssica- Ah! Então me explica! Como uma coisa que eu tenho certeza que coloquei nesta caixa de joias, pode não estar mais aqui?

Jorge- Provavelmente, porque você colocou em outro lugar e não lembra! Você já não é, assim, tão jovem!  A memória pode falhar as vezes.  Eu não acredito que você está me acusando! Eu estou te desconhecendo!

Jéssica- Eu preciso desse anel! E não me chame de velha! Hoje é o dia da reunião de turma da faculdade! A gente não se vê desde a formartura, há dez anos! Todos irão com seus aneis. Eu não posso aparecer com os dedos nus.

Jorge- Você me acusou de ladrão! Não posso acreditar!

Jéssica- Mas se não foi você,  estamos diante de um mistério. Eu juro que eu coloquei ontem a noite nesta caixa. Eu lustrei o anel, conversei com ele...

Jorge- Conversou com o anel?

Jéssica- Ah..., eu fiquei falando dos velhos tempos! Que iria rever os amigos e inimigos, e iria passar na cara de todos eles, o meu sucesso. Você sabe, vários deles estão desempregados, trabalhando em outra área,  não deram certo na profissão... Mas eu, não! Sou bem sucedida, bem casada, rica. Eles vão ver...! Aquela mocinha de aparelho, cheia de sardas, não existe mais! Meus dentes estão perfeitos e meu lifting, também! Cadê meu anel? Para de brincadeira, Jorge! Eu sei que você escondeu meu anel!

Jorge- Ah! Agora eu escondi?  Antes eu havia roubado pra vender! Como você muda de opinião rapidamente! Não é Jessica? Eu nunca vou esquecer que você me chamou de ladrão. Eu nunca vou te perdoar!

Jéssica- Ah, meu amor! Desculpa! Não foi isso que eu quis dizer! É que eu estou nervosa! Faz tempo que não vejo essa gente! Preciso estar com tudo em cima , inclusive o meu anel!  Então!? Onde está?  Vai, Jorge! Eu sei que você só está brincando!  Você gosta de me deixar nervosa, né?  Devolve o anel e fica tudo bem!

Jorge- Está tudo acabado entre nós!

Jéssica- Ah! HAHAHAHAHAHA! Para com isso, Jorge! Que bobagem! Você está muito brincalhão, hoje!  Já está passando do limite. Meu anel!

Jorge- É impressionante, como você não se importa com ninguém!  Magoa as pessoas numa facilidade... e depois fica tudo bem! Eu estou cansado de ser seu capacho, Jéssica! Você me chamou de ladrão!  Desconfiou de mim! Eu não quero uma pessoa ao meu lado que não confia em mim! Tenha a santa paciência!

Jéssica- Jorge! Para de drama, Jorge! Me devolve o anel. Tenho muita coisa pra fazer ainda hoje antes de ir a festa.

(Jorge olha para Jéssica, incrédulo.)

Jéssica- Por que está me olhando desse jeito?  Eu já pedi desculpas. Você não é ladrão, eu sei! Mas me devolve o anel, agora. Eu perdoo a sua brincadeira de mal gosto. Dá!

Jorge- Eu não estou com o seu anel! E EU NÃO QUERO MAIS SABER DE VOCÊ!

Jéssica- Chega, Jorge! Já estou ficando irritada!

Jorge- Eu estou falando sério! Como eu pude me enganar, assim, com você? Tanto tempo se passou! No primeiro ano de casamento foi tudo tão maravilhoso. Parecia que eu tinha encontrado a mulher da minha vida. Todo mundo me dizia que você era chata, insuportável! Que se eu me casasse com você seria a maior burrada que eu faria na vida. Mas eu nem ligava. Achava que você tinha aquele jeitão destemido e imponente, porque era forte,  tinha uma personalidade marcante. Os anos foram passando e eu fui perdendo o encanto.  Sua máscara foi caindo aos poucos.  Demorou, mas eu fui percebendo quem você realmente era. Todos temos defeitos. Eu, também.  Sei que que não sou perfeito! Mas sempre te respeitei, apoiei. Queria continuar tentando ter uma vida com você. Queria que desse certo. E você sempre me pisando, passando na minha cara que ganhava mais que eu, que praticamente sustentava a casa sozinha. Mas eu fui aguentando calado, porque eu te amava, eu sempre de amei!

Jéssica- Meu Deus! Tudo isso por causa de um anel?

Jorge-  Pois, é! Tudo isso por causa de um anel, Jéssica? Você acaba com o meu dia, acaba com um resto de respeito que eu ainda tinha por você, por causa de uma porcaria de anel de formatura?

Jessica- Porcaria, não! É cravejado de brilhantes!

Jorge- Pois você pega esse cravejado de brilhantes e...

Jessica- Jorge? Você nunca me xingou!

Jorge- Nem agora! Sempre me cortando! Não me deixa nem me expressar direito! Cansei Jéssica! Cansei!

Jéssica-  (Fica olhando um tempo para Jorge. ) Então tá! Agora, olha dentro dessa caixa de joias e vê! Será que eu estou ficando louca? Revirei as joias todas e não achei o anel! Veja você, mesmo! Eu deixei aí e agora não está mais! Eu não estou te acusando. Mas só estamos os dois aqui! Quem pegou o anel, então?

Jorge- (Olhando para dentro da caixa.) Ninguém, Jéssica! Ninguém!

Jéssica- Como assim...

Jorge- (Retira de dentro da caixa de joias, o anel de formatura, intacto.) -  Aqui está o seu precioso anel! No mesmo lugar que você disse ter colocado.

Jéssica-Mas não é possível! Eu olhei tudo aqui dentro e não vi o anel!

(Jorge começa a arrumar uma pequena mala.)

Jéssica- Jorge! O que você está fazendo? Já encontramos o anel.  Eu devia estar muito ansiosa!  A ansiedade faz a gente não enxergar as coisas com clareza. ( Pega no braço de Jorge.)-  Jorge, para com isso, Jorge!  Me perdoa! Não faz assim! Olha! Só pode ter sido um espírito brincalhão que fez isso. É comum acontecer um fenômeno assim! Quando eu era criança, procurei uma boneca minha por toda parte da casa e briguei com uma amiguinha. Achei que ela havia roubado a minha boneca. Quando eu a expulsei de casa e ela foi embora, olhei para o canto perto da cama e a  boneca estava lá,  no mesmo lugar que eu a deixava sempre. Se uma boneca, eu não fui capaz de enxergar, imagina um anel que é infinitamente menor!  Os espiritos zombeteiros adoram fazer essas brincadeiras e colocar as pessoas umas contra as outras. Eu nunca mais vou desconfiar de você! Eu juro!

Jorge- (Continuando a fazer a mala.) E essa sua amiguinha de infância? Você se desculpou com ela?

Jéssica- Claro! Eu pedi desculpas, sim! Não tenho nenhum problema em pedir desculpas, quando reconheço meu erro! Ela me perdoou, mas disse que não seria mais minha amiga, porque não confiava mais em mim, só porque desconfiei... (caindo em si) ...dela!

Jorge- Pois é! Essa sua amiguinha de infância é muito sábia! E eu também te perdoo! Mas não dá mais pra gente ficar junto! O resto das minhas coisas eu pego depois. Se divirta na sua festa! Amanhã ou depois  a gente vê a papelada do divórcio, essa burocracia toda!

Jéssica- Divórcio? Que divórcio? Você vai me deixar por causa de uma bobagem de anel?

Jorge- Não é o anel! É tudo! Você não entende! Só pensa em si! Tem o ego do tamanho do mundo! Não liga pra ninguém! Eu não quero falar mais nada! Só quero ir embora! Pensa na sua vida, Jéssica! O mundo não gira ao seu redor, não! Acorda!  (Sai batendo a porta).

Jéssica- (Abre a porta e chama por ele.)- Jorge, volta! VOLTAAAAA!!!!! Não vai embora! (Chorando copiosamente.) Foi o espírito zombeteiro! Não é culpa minha! E agora? Quem vai comigo a festa? Vão pensar que eu não tenho marido! Volta Jorge! AAAAAAAAAAH! AAAAAAAAAAH! (Fecha a porta e, chorando desesperada, vai deslisando as costas contra a mesma até o chão, alla Malu Mader em "Anos Rebeldes").


                                                           Fim


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