terça-feira, 27 de dezembro de 2011

POR LINHAS TORTAS de Kadu Veríssimo

(tema 2012)

Personagens

Mariana
Moça
Homem
Médico

 (Ano Novo – Praia – minutos para a entrada do Ano Novo)

Mariana
Não acredito que vim sozinha passar o ano novo na praia, olha só, todo mundo acompanhado, não to vendo ninguém sozinho, só eu...mas tudo bem, vim aqui jogar essas rosas vermelhas no mar pra ver se nesse ano que inicia eu arrumo um companheiro, um homem  simpático, trabalhador, gentil, bonito (suspira) custe o que custar meu Deus, manda esse homem pra mim....

(olha para o lado e vê um casal apaixonado trocando beijos com um champagne na mão, o casal vai estourar o champagne, a rolha voa e acerta direto no olho de Mariana)

Mariana
Meu olho, meu deus, meu olho, vou ficar cega dessa vista, que dor (deixa as rosas caírem no chão) as rosas, não podem estragar

(abaixa pra pegar as rosas, um grupo de adolescentes passa correndo e esbarra nela que cai de boca na areia)

Mariana
(cuspindo) que droga, estou quase cega de um olho e empanada agora, que ano de merda, que azar, acaba logo essa merda ...

(as pessoas ao lado começam a contagem regressiva, ela vai ver as horas e se dá conta que roubaram seu relógio)

Mariana
Fui roubada, fui roubada.... (ninguém lhe dá atenção, escuta-se, dez, nove...) que ano de merda, que ano de merda o que mais falta acontecer meu deus (escuta-se três, dois, um...Feliz Ano Novo) 

(queima de fogos) (alguém grita )

Mariana
Que grito foi esse? E esse cheiro de queimado....

Moça
(desesperada)Seu cabelo...

Mariana
Meu cabelo?

Moça
Ta pegando fogo...

Mariana
Meu Deus, caiu fogos no meu cabelo, socorro, socorro...(corre pro mar e se joga) eu quero morrer, quero morrer, começar o ano com essa maré de azar, não é possível, o que eu fiz para merecer isso...(sai do mar ) gente, estou quase nua, minha roupa ta toda transparente, vou fugir desse lugar horroroso, me trancar no meu quarto e só sair no ano que vem (vai correr mas pisa em rosas com espinhos) Aiiiiiii, meu pé, meu pé ta sangrando, porque não tiram o espinho das rosas caralho, ai que dor, que dor 

(tenta correr mancando , é empurrada por um grupo animado que se abraça e cai no centro de uma roda de umbanda, seu olho direito esta fechado, esta toda torta, um homem bota a mão na sua cabeça e começa a girar)

Mariana
Para com isso, para com isso

Homem
Fale o que veio dizer, você foi enviada para nos dizer algo...

Mariana
Me larga, me larga para de me girar...

(ficam girando ela , passando de pessoa em pessoa, ela fica tonta e cai em cima das velas acesas)

Mariana
(dá um grito de dor) Ai!

Homem
Quem ta ai? Quem se manifesta?

Mariana
Vai Tomar no cú !

(Mariana empurra o homem e sai correndo com a força que lhe resta)

(na escada para subir ao calçadão)

Mariana
Deixa eu passar por favor, eu to toda machucada...quanta gente, que inferno..., deixa eu passar, deixa eu passar...(a muvuca se aperta) calma gente, calma, eu to machucada, não empurra...(a muvuca se irrita e aperta ainda mais) eu to ficando sufocada, ta me machucando gente, espera, calma gente, todo mundo vai sair, calma, meu deus, MEU DEUS !!!

(desmaia)

(No Hospital)

(Mariana esta toda enfaixada ,dorme, ao abrir os olhos vê o médico que está de costas)

Mariana
(sussurando) Doutor, Doutor...

( O Médico vira, é o homem mais bonito que Mariana já viu na vida)

Médico
Olá Mariana, que noite hein...pode ficar tranqüila e relaxar, eu estou aqui pra cuidar de você...

Mariana
(fala com dificuldade) Doutor ,eu posso lhe fazer uma pergunta...

Médico
Claro, até duas

Marina
Duas? Então tá...O Sr é casado?

Médico
Não, não sou...

Mariana
É gay?

Médico
Também não...

Mariana
Posso fazer a terceira?

Médico
Claro

Mariana
Quer casar comigo?

( e aquele foi o melhor ano de sua vida)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Sugestões para 2012 de Regina Célia Vieira

Tema: 2012




A- Em 2012, eu vou emagrecer!


B- Todo ano você diz a mesma coisa.


A- Não! Desta vez é verdade! Vou voltar a pesar 60 kg. Pode apostar.


B- Não faço apostas. Sou contra jogo. Minha religião não permite.


A- Mas, fumar, a sua religião permite?


B- Não! Mas, é difícil se livrar dos vícios.


A- E como você não é viciada em jogo...


B- É isso, mesmo! Não gosto de jogo.


A- Pois você devia parar de fumar em 2012. Muda de vida! Isso faz mal! Tá acabando contigo.


B- Eu fumo e você bebe. Beber pode?


A- Pelo menos eu não jogo bebida na cara de ninguém. Já, fumaça... você nem pede licença e taca na cara de qualquer um. Não sou obrigada a inalar a sua fumaça, não!


B- Você não joga bebida na minha cara, mas fica com um bafo desgraçado de cerveja, que a gente sente lá da esquina. Por que você não para de beber em 2012?


A- Minha cervejinha, não largo por nada deste mundo!


B- Então não me venha falar do meu cigarro! Essa é boa!


A- A minha cerveja não põe a vida dos outros em risco! Já, o seu cigarro, deve ter criado um câncer em alguém. Ou você nunca ouviu falar em fumante passivo?


B- E você nunca ouviu falar em lei seca? Sim, porque quando você bebe, pega o carro e sai em disparada, pondo a vida dos que não bebem, em perigo. Ao menos, o meu cigarro, não me deixa fora de mim.


A- Mas, a maconha deixa. Pensa que eu não sei que você dá uns pega de vez em quando? Colabora com o trafico! Muita gente morre por causa da sua maconhazinha. Você devia largar essa droga em 2012, antes que seja expulsa da sua igreja.


B- O que eu vou fazer em 2012, é parar de deixar os outros se meterem na minha vida. Sua fofoqueira! Você já prejudicou muita gente com a sua fofoca. Por que você não para de fofocar em 2012?


A- E por que você não para de dar em cima do marido dos outros em 2012?


B- E desde quando eu dou em cima do seu marido?


A- Do meu não, que nem eu, ligo pra aquilo. Mas em cima do marido da minha irmã, você dá, sim.


B- Sua irmã devia se divorciar em 2012. Ela não dá valor ao homem que tem! Se ele me desse bola, eu roubava ele dela, sim! E você, com isso?


A- Você é cara de pau, mesmo! Devia deixar de ser tão vadia em 2012.


B- E você devia deixar de ser tão invejosa em 2012. Ao invés de invejar a minha beleza, podia ao menos se esforçar pra emagrecer em 2012. Não passa nem na porta de tão gorda.


A- Em 2012 eu vou emagrecer!


B- Todo ano você diz a mesma coisa!
 

Um Sopão Natalino de Regina Célia Vieira

Tema: Natal




(Genaro era um homem muito rico, só pensava em trabalho. Um dia ele se encontrou com uma colega da época de colégio, Rute, que não via há muito tempo. No meio da conversa ela falou que participava de programas sociais. E que no dia de Natal, servia sopa aos moradores de rua.)


Rute- Você não gostaria de servir sopa com a gente, no dia 25? Vai ser na hora do almoço. É muito legal! O pessoal fica  muito contente, porque a gente conversa, troca idéias. Então? Você quer? Servir sopa com a gente?


Genaro- Eu não sei, Rute! Tem o almoço em família... Minha mulher não vai gostar nada... Ah! Quer saber? Eu vou, sim!  Nunca faço algo por alguém, só trabalho e esqueço do próximo. Vou lá, ajudar os pobres!


Rute- Ótimo!


(Alguns dias se passaram e Genaro ligou para Rute no dia 24, pela manhã!)


Genaro- Alô,  Rute! Genaro. Tudo bem?... É hoje o dia da sopa?


Rute- Não! É amanhã! Dia 25. Na hora do almoço! Lembra?


Genaro- Ah, é! No almoço!


Rute- Olha! Não vai esquecer, hein! Estamos contando com você!


Genaro- Já me comprometi! Achei muito legal, você me convidar! Quero fazer o bem, neste Natal! Trocar o almoço em família, no conforto do lar, pela dedicação aos pobres!


Rute- Eu vou todo ano e me sinto muito bem. Você vai gostar. A gente conhece pessoas fantásticas que moram na rua.


Genaro- Mas me diz uma coisa. Por que vocês servem sopa? Num calor desse... Não seria melhor servir algo mais refrescante?  Uma salada de bacalhau ou salpicão de frango? Um calor de 41 graus, como o de hoje... Servir sopa?


Rute- Com o dinheiro que a gente arrecada, só dá pra fazer sopa! Mas é uma sopa especial. É o sopão da Cida. Uma sopa caprichada, com todos os legumes. E tem frango também. A Cida faz um tempero gostoso. E ela adora cozinhar. Faz com muito carinho. Todos os anos, o sopão é um sucesso! O pessoal gosta e repete. A sobremesa é uma fruta e damos um mini panetone de presente. Fora a água e o suco.


Genaro- Vocês pedem pouco dinheiro pros voluntários. 20 reais. Pra que serve?


Rute- O pessoal ainda reclama! Acham muito! Dizem que já servem a sopa e não precisavam dar dinheiro. Mas se ninguém der, não tem sopa. Falou em dinheiro, esse povo não abre a mão, não! Claro, que não são todos assim, mas muitos, são.


Genaro- Pois eu tenho dinheiro! E vou proporcionar para essas pessoas carentes, o melhor Natal de suas vidas!


Rute- Genaro! O melhor Natal da vida delas, com certeza aconteceu quando elas tinham casa. Por melhor que seja a comida, elas estão na rua, agora.


Genaro- Não importa! Elas provavelmente nunca comeram o salpicão que eu preparo no Natal! E vou fazer um bacalhau que,  com certeza, nunca provaram.


Rute- Muitos dos que estão na rua, já comeram muito bem, sim. você não sabe da vida deles!


Genaro- Vou por a mão na massa. Vou comprar os ingredientes e preparar um almoço natalino inesquecível!


Rute-Mas nós já compramos tudo pra sopa. O pessoal vai preparar hoje a noite.


Genaro- Pois aproveitaremos os legumes e o frango que foi comprado. Isto não é problema. Todo mundo ajudando, sai rapidinho, o almoço.


Rute- Está bem! Se você pode e quer gastar... A gente agradece! Vamos lá!


Genaro- Até lá, então!


Rute- Tchau!


(No dia 25, os voluntários estavam todos posicionados em seus lugares para servir o almoço de Natal aos moradores de rua. Tinha muito bacalhau, salpicão e sobremesas diversas!)


Rute- Os pratos estão lindos! Você sabe, mesmo, cozinhar!


Genaro- Fiz curso de gastronomia em Paris há alguns anos. Só pra cozinhar pra família, mesmo.


Rute- Quem pode, pode. Olha! Eles já estão chegando! Bom dia, pessoal! Feliz Natal!


Pessoal- Bom dia! Feliz natal!


Genaro- Feliz Natal!


(As pessoas eram servidas pelos voluntários. Quando chegava a vez de Genaro, que estava servindo o salpicão, um comentário sempre se ouvia.)


Genaro- Senhora! Espero que goste deste salpicão. Pode ter um ingrediente que a senhora não indentifique. É funghi.


Rute - (Sussurrando) Que é isso, Genaro?


Genaro- Se livrou de tomar uma sopa quente, hoje! Hein, amigão?


Rute- (Baixinho) Por favor, Genaro!


Genaro- Oi, moça! Você vem todo ano aqui? Espero revê-la no ano que vem!


Rita- (Alto) Chega! (Se contendo) Você está constrangendo as pessoas!


Genaro- Só estou tentando puxar conversa! Você falou que conversa com eles! Só estou ouvindo você desejar, Feliz Natal, e nada mais!


Rute- A gente conversa depois! Agora o que eles querem, é comer! Parece maluco...(Para os sem teto) Feliz Natal! Feliz Natal!


Genaro- Feliz Natal!


(Todos foram servidos e alguns repetiam.)


Rute- Podemos comer agora. Estou louca para experimentar esse salpicão!


Genaro- Você vai adorar! E pessoal! Tem muito salpicão. Sobrando, vocês podem levar pra casa!


Rute- (Sempre sussurrando) Mas que casa! Eles não tem casa! Genaro você tá louco!


Genaro- Você tem razão! Desculpa, gente! Eu esqueci que vocês não tem casa! Então é melhor comer tudo aqui, mesmo!  Ou então, levem pra onde vocês forem!


(Rute não sabe onde enfiar a cara)


Cida- (pra outra colega) Quem mandou desprezar o meu sopão!


(Uma pessoa começa a passar mal. Com a mão na barriga, geme desesperada. Outra vomita. Um homem corre pro banheiro.)


Rute- Meu Deus! O que está acontecendo? O senhor está bem?


Homem- Minha barriga tá doendo muito.


Cida- Vou ligar pro Pronto Socorro!


Rute- É melhor a gente levar todos, nos nossos carros. É mais rápido!


Genaro- Mas por que eles estão assim? A comida foi preparada com o maior cuidado!


Rute- Agora não adianta procurar a causa do problema. Vamos correr.


(Todos seguiram para o hospital mais próximo. Alguns estavam em estado mais grave e precisaram de internação.)


Rute- O médico disse que foi intoxicação alimentar. Graças a Deus estão todos fora de perigo!


Genaro- Não sei o que aconteceu, mas tudo vai ficar por minha conta. E os que estão internados só saem daqui quando estiverem totalmente curados!


Rute- É o mínimo que você pode fazer! Os que estão melhor, vão passar a noite na associação. E vamos preparar uma canjinha pra eles!


Genaro- Nesse calor?


Rute- Me poupe! Se eles tivessem tomado a sopa não estariam aqui a essa hora!


Genaro- Eu tive a melhor das intenções! Não vem me acusar, não!


Rute- Você com a sua arrogância, só fez humilhar as pessoas que já vivem numa situação mais que humilhante. Só quis aparecer, deixando o almoço, todo, por sua conta. Não se doou com sinceridade. Por isso, sua comida fez mal.


Cida- por isso e por causa do creme de leite que ele usou no salpicão. Voltei na associação para verificar o que poderia ter acontecido. Olhei as embalagens vazias e descobri que o creme de leite está vencido há mais de um mês. Tá aqui a embalagem.


Rute- Que absurdo, Genaro! Você, quando faz compras, não olha a validade dos produtos, não?


Genaro- Eu estava com pressa! Puxa vida! Eu vou indenizar as pessoas. Pode deixar! Eu tenho dinheiro!


Rute- Sempre assim, desde a escola. Esfregando o seu dinheiro na cara de todo mundo! Só eu sei o que passei com você no colegial. Você e seus amigos zombando da minha condição de bolsista. Era só eu chegar na escola e vocês gritavam; -Lá vem a bolsista! Trouxe a marmitinha, bolsista? Ela veio de taxi! Claro, o pai dela é o motorista!- E caiam na gargalhada! Pois fique sabendo, que tenho muito orgulho do meu pai taxista e da minha bolsa de estudos. Foi graças aos meus pais e a minha bolsa, que eu consegui entrar em uma boa faculdade e me formar jornalista. Posso não ser milionária, como você. Mas o pouco que tenho, foi conquistado com muito trabalho e talento.


Genaro- Nossa! Quanto rancor! Eu nem me lembrava disso. Me desculpe!


Rute- Tá desculpado! Eu só não fico com raiva de você, porque do seu jeito torto, vai acabar ajudando, sem querer  a essas pessoas sem teto. Eu vou ficar no seu pé. Você vai indenizar esse pessoal com uma casa pra cada um. Se não eu te processo. E o seu nome vai ficar bem sujo. Você é um empresário famoso, não vai querer que isto aconteça. E também, quero sua ajuda, para recolocá-los no mercado de trabalho. Se não nas suas empresas, nas empresas de seus conhecidos. Afinal,  tem contato com muita gente influente.


Genaro- Você é quem manda! Mas eu quero que vocês saibam, que eu iria reparar o meu erro com essas pessoas, mesmo sem a sua ameaça. Eu não sou um sujeito ruim!


Rute- Eu sei disso. Eu só queria te dar uma lição. Tô leve! Agora vamos, Cida! Vamos dar a boa notícia pra turma! Finalmente eles vão ter um feliz Natal! Até logo, Genaro!


Genaro- Até logo! (Baixinho) Bolsista!
(Para a atendente) Mocinha! Por favor! Quanto está a minha conta, por enquanto?


Atendente- Aqui está, senhor!


Genaro- Uau! Desse jeito, eu é que vou acabar sem teto!


Moral da história:
Mais vale um sopão com fé, que um salpicão com soberba.


Feliz Natal!

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

É TUDO PELO SANGUE de Marcus Di Bello

TEMA: NATAL

(Casa qualquer de um bairro nobre de uma cidade qualquer com mais de quinhentos mil habitantes. Noite de natal. Muitos parentes. Correria de criança, os bigodudos bêbados de vinho e as senhoras comentando que a Fátima Bernardes não deveria ter saído do Jornal Nacional. Magda está isolada, num canto da casa, bebendo uma taça de vinho. Rogério se aproxima)

ROGÉRIO
Que calor, hein.

MAGDA
Como é?

ROGÉRIO
Calor. Está fazendo muito calor.

MAGDA
Ah, é verdade.

ROGÉRIO
Não sei nem porque a gente tenta imitar essas tradições dos outros países. Peru e pernil são comidas muito quentes. Deveríamos tomar sorvete no natal.
(Magda faz careta, como se não desse ouvidos a Rogério)
Eu acho que não nos conhecemos.

MAGDA
Sou amiga da Viviane, sobrinha da Dona Rita.

ROGÉRIO
Amiga da Vivi? Que demais! Meu nome é Rogério, eu sou amigo do cunhado da Marcinha.

MAGDA
Legal.

ROGÉRIO
Quer mais vinho?

MAGDA
Estou bem.

ROGÉRIO
Que isso! Beba mais. No natal é permitido. É o único momento que a gente pode beber sem se preocupar, sem que os outros pensem besteira. Afinal, é o sangue de Cristo! Viva Cristo!

MAGDA
(Demonstrando impaciência)
Pelo visto você fez transfusão já.

ROGÉRIO
Tudo em nome da confraternização. Da união familiar.
(Bebe a taça de vinho que está nas mãos de Magda)
Que vinho bom.
(Magda vira de costas)
Veja bem, natal é época boa.
(Tempo)
Não é?

MAGDA
É.

ROGÉRIO
Qual é o seu nome?

MAGDA
Magda.

ROGÉRIO
Legal.O meu é Rogério!
(Cada vez mais demonstrando a embriaguez)
Sabe o que eu mais gosto do natal, Magda?

MAGDA
Não.

ROGÉRIO
O espírito natalino. Falam que natal é só uma data pra aumentar o consumo do comércio e que as pessoas são falsas e fingem gostar umas das outras nessa época. Acredite, isso acontece o ano inteiro. Olha para essa casa, cheia. Acha que as pessoas aparecem por aqui durante o ano? E qual é o problema em aparecer agora? Olha para essa mesa cheia de comida. Olha para esse tanto de bebida.
(Diz a próxima fala muito lentamente)
Olha para nós dois.

MAGDA
(Direta)
Pois eu odeio natal.

ROGÉRIO
Por quê?

MAGDA
Apenas não gosto. Não sei. O shopping lota.

ROGÉRIO
Mas isso que é bom. Se quiser sossego fica em casa. Shopping é para ser lotado mesmo. É para ser difícil conseguir uma mesa na praça de alimentações. É para ser difícil entrar numa loja que tenha alguma promoção. Isso é seleção natural, manja? Darwin explica.

MAGDA
Odeio o Papai Noel.

ROGÉRIO
Odiar o Papai Noel? Em que mundo você vive? Ele é demais.

MAGDA
É o símbolo do consumismo!

ROGÉRIO
Besteira. Símbolo do consumismo é a arara, que está estampada no nosso dinheiro. Papai Noel é demais. É um velhinho que se veste de vermelho, que usa barba branca, tem renas de estimação e dá presente para as crianças. É uma bicha velha. Como não gostar disso?

MAGDA
Prefiro réveillon.

ROGÉRIO
Réveillon? Como você pode preferir réveillon? Natal que é bom! O que tem na virada do ano? Contagem regressiva para o próximo ano? Que besteira.

MAGDA
É um momento de mudança. Continuação do ciclo da vida. Ano novo é melhor.

ROGÉRIO
Natal que é.

MAGDA
É o ano novo!

ROGÉRIO
É o natal! O espírito natalino que é bom.

MAGDA
Ano novo! Traz novas sensações e vibrações.

ROGÉRIO
O natal é melhor. É o nascimento de Cristo, de toda a bondade da Terra.

MAGDA
Ano novo traz prosperidade.

ROGÉRIO
O natal que traz. Você está falando besteira.
(Tempo)
Eu me chamo Rogério, prazer.

MAGDA
Cala a boca. Você está bêbado.

ROGÉRIO
Magda, quer montar árvore de natal comigo?

MAGDA
Não.

ROGÉRIO
Seja a minha estrela.

MAGDA
Já disse que não. Eu nem te conheço.

ROGÉRIO
Foi porque eu falei do réveillon? Desculpa. Eu posso até concordar com você, mas você precisa me deixar comer o seu chester.

MAGDA
Seu idiota, sujo! Quer saber? Tchau. E ai de você se pensar em falar comigo novamente. Fique longe de mim. Se vier falar comigo eu te dou um soco. Faz isso pra você ver.
(Sai irritada)

ROGÉRIO
(Imitando a última fala dela com sarcasmo)
Bla bla bla bla bla pra você ver.
(Berrando)
É! É o quê? Pra ver ou pra comer?
(Sozinho. Olha para a taça de vinho)
Será que foi por causa do chester? Talvez tenha sido a discussão sobre o que era melhor.
(Tempo)
Deus! Ela não sabe o que faz. Mas da próxima vez faz o seu filho nascer longe do ano novo, assim evita comparações e, consequentemente, brigas. Mas o Senhor faz o que achar melhor. Afinal, é tudo pelo sangue!

(Fade out)

domingo, 18 de dezembro de 2011

26 DE DEZEMBRO de Kadu Veríssimo

(tema Natal)

Personagens

Papai Noel
Mamãe Noel

(26 de dezembro, Papai Noel chega em sua casa e encontra malas e caixas na rua, percebe que a fechadura da porta foi trocada)

Papai Noel
Oh! O que será que está acontecendo?

(toca a campainha)

Mamãe Noel
Some!

Papai Noel
Mamãe, abre essa porta...

Mamãe Noel
Some daqui eu já disse...

Papai Noel
Abre essa porta, vamos conversar mamãe...

Mamãe Noel
Para de me chamar assim, eu não sou sua mãe, sou sua esposa, ou melhor era....

Papai Noel
Outra vez não...abre essa porta...

Mamãe Noel
Se insistir eu chamo a polícia, ou mando um urso polar comer sua cabeça, ou eu mesma te mato com as minhas próprias mãos...(chora)

Papai Noel
Você precisa voltar a tomar seus remédios

Mamãe Noel
(abre a porta) Tá me chamando de maluca?

(ele entra)

Papai Noel
Ainda bem que abriu...

Mamãe Noel
Pois pegue essas renas malditas e foge daqui , eu não quero ver sua cara barbuda outra vez...

Papai Noel
Não começa vai, você casou comigo sabendo que ia ser assim...

Mamãe Noel
Nenhum natal, nenhum você passou comigo...sempre por aí distribuindo presentes, e o pior, tudo de graça...o que me consola é que a maioria das crianças não acredita mais em você, seu velho babão...

Papai Noel
Chega , quem não agüenta mais sou eu....todo ano a mesma história, vai se tratar você esta doente...

Mamãe Noel
Eu estou na menopausa, estou nervosa e preciso de um companheiro do meu lado, eu pedi de natal , eu quero um companheiro que seja presente , me satisfaça e me deixe feliz e odiei o presente que você deixou pra mim...

Papai Noel
Você queria um companheiro, eu pensei que...

Mamãe Noel
Você pega aquele vibrador e dá pra alguma vadia, você ta pensando o que? Vou mandar meu advogado te procurar, nunca mais quero te ver...

Papai Noel
Se é assim que você quer...

Mamãe Noel
Cansei de ficar sozinha no Natal, cansei...fique com esses duendes, com esses viados...

Papai Noel
São renas...

Mamãe Noel
Eu vou te deixar na miséria, vou te arrancar as cuecas você vai ver...Some, some daqui...(vai empurrando ele pra fora), me deixe ao menos ter uma Noite Feliz...e outra coisa, o que importa na Noite de natal é Jesus, Jesus e não você seu velho peludo e fedorento.

(bate a porta na cara dele, a neve cai)

Papai Noel
Tá muito frio aqui fora mamãe, abre essa porta, amoleça esse coração...é natal...

Mamãe Noel
(de dentro) O natal já passou, hoje é vinte e seis de dezembro...

(Papai Noel pega um cd player e põe o cd de natal da Simone pra tocar, a música então é natal)

(Mamãe Noel abre a porta)

Papai Noel
Sabia que você ia amolecer...

(Mamãe Noel está com uma marreta gigante e bate com tudo no cd player, estraçalhando-o)

Mamãe Noel
Eu odeio está música, odeio este cd, eu odeio a Simone, eu odeio você... esta mulher se não fosse sapatão acharia que é sua amante, porque ela só aparece no Natal pra cantar, e é quando você também some...

(Papai Noel tenta falar algo, mas Mamãe Noel é mais rápida)

Mamãe Noel
Não adianta Papai Noel, está tudo acabado entre nós, deveria ter escutado minha mãe, mas caí no conto do bom velhinho e me ferrei...some daqui, some da minha vida, Adeus!

(bate a porta novamente na cara dele, a neve continua a cair, um boneco de neve ri)

Papai Noel
Oh! Oh! Oh! (pega o celular) Alô? Coelhinho da Páscoa? Posso passar a noite aí ? Aqui é Papai Noel...ah não vai dar ? Ta sem toca também...coelha te mandou pra fora é? Sei...sei bem como é...

(vai andando arrastando o saco)

(Black-Out)

Férias sem fim de Regina Célia Vieira

Tema: Férias


Elvira- (No telefone) Está bem! Estamos esperando! Beijo!
Benheeeeeê!

Pedro- Que foi?

Elvira- Eu tenho uma novidade pra te contar!

Pedro- Fala!

Elvira- Senta!

Pedro- Ihhhhh!

Elvira- É que é uma coisa boa e ruim ao mesmo tempo!

Pedro- Boa e ruim?

Elvira- Boa pra mim! Ruim pra você!

Pedro- Eita! Você quer se separar de mim?

Elvira- Que é isso! Para de bricadeira!

Pedro- Sei lá! Ué! Não tô entendendo!

Elvira- Como eu poderia te dizer! (sussurrando) É que a mamãe vai passar as férias aqui em casa!

Pedro- (Não escutando) O que?

Elvira- (Falando alto) A mamãe vai passar as férias aqui em casa!

Pedro- (Gritando) O queeeee!!!!!

Elvira- Calma Pedro! É só um mês! E a mamãe te adora, vai!

Pedro- Só um mês? E você queria que fosse quanto tempo? Um ano? Pelo amor de Deus! Eu não aguento a tua mãe! Velha pegajosa! Grude! Não me deixa em paz um segundo! -Pedrinho! Você tá dodói, Pedrinho? Quer que eu te faça um chazinho, meu genro? Ai, Pedrinho! Como você é fofo! Queria tanto que você fosse meu filho, Pedrinho!- A sua mãe parece que quer me adotar! Esquisita... Ai! Tá me dando até coceira, só de imaginar ela, aqui! Velha chata, mala do caramba!

Elvira- Para de falar assim da minha mãe! Queria ver se ela te tratasse mal, o que você ia dizer! E ela não é velha! Só tem 56 anos! Tem muita vida pela frente, ainda!

Pedro- Mas como você convida a sua mãe, sem me consultar? Eu não estou preparado para receber ela, não!

Elvira- Eu não sabia que ela vinha! Ela quis fazer...

Felícia- Surpresa! (Entrando sem bater)

(Pedro fica realmente surpreso e coça, com força, entre os dedos)

Felícia- Ai! Como vai minha filhinha?

Elvira- Tudo bem, mamãe! Pois é, Pedro! A mamãe estava estacionando o carro, quando ligou agora há pouco pra dizer que iria passar as férias aqui. Não é demais? (Abraçando a mãe)

Pedro- É demais! É demais! (Se coçando sem parar)

Felícia- Não é facil estacionar nessa cidade, não! Vocês vão ter que arrumar uma vaga na garagem pro meu carrinho! E você, meu genrinho preferido! Como vai? (Abraçando Pedro)

Pedro- Genrinho preferido? Eu sou seu único genro, Felícia!

Felícia- Único e insubstituível. Ai da minha filha, se um dia se separar de você! Rompo com ela, pode crer!

Pedro- Ah! Ah! Ah! Ai, ai! (Ri sem graça)

Felícia- Onde coloco minhas coisas, filha?

Elvira- No quarto de sempre! Tá arrumadinho do jeitinho que a senhora deixou da última vez.

Felícia- Espero que você tenha passado pelo menos um aspirador lá, hoje, Elvira!

Elvira- Todo dia eu passo aspirador na casa, mamãe! Pode ver que tá um brinco!

Felícia- É! Parece que você aprendeu a ser dona de casa, mesmo! Mas não é só passar o aspirador!
Tem que limpar com desinfetante, água sanitária... pra matar as bactérias. Seu marido é alérgico a tudo. Tem que cuidar bem do meu genro! Não quero que ele sofra com fungos!

Pedro- Começou!

Felícia- O que você disse, Pedrinho?

Pedro- Almoçou?

Felícia- Claro que não! Vim filar a bóia do meu genrinho mestre cuca! Acha que eu ia perder a oportunide de saborear uma culinária deliciosa! Aliás, o que tem pra hoje? E não me venha com macarrão, só porque é domingo! Eu preciso emagrecer!

Pedro- E como!

Felícia- O que?

Pedro- Não como! Também não como mais macarrão! Eu também preciso emagrecer!

Felícia- Que é isso? Você está ótimo! Fofinho assim, que é bom! Gostosinho! (Apertando a bochecha)

Pedro- (De saco cheio) Ah! Para, Felícia!

Felícia- Até parece que não gosta!

Elvira- Mamãe! A senhora quer guardar suas coisas lá no quarto, enquanto eu coloco a mesa? Aproveita e toma banho! A viagem deve ter sido cansativa!

Felícia- Já volto! Tô louca para experimentar a comidinha do Pedrinho!

Pedro- Que morra de gula!

Felícia- O que você disse, querido?

Pedro- Tem molho de lula! Eu fiz!

Felícia- Adoro lula! E o prato principal?

Pedro- É Salmão!

Felícia- Hummmmmm! Volto já!

Elvira- Você é fogo, hein, Pedro! Agora, faz o molho de lula, senão ela não vai entender nada!
Fica resmungando que nem velho!

Pedro- Velha  aqui só a tua mãe! Droga! Ainda bem que tem lula no freaser! Vou descongelar no micro.

Elvira- Vê se segura a língua, por favor! Por mim! Faz tempo que eu não vejo minha mãe!

Pedro- Pra quê? Ela te liga todo dia! Só falta se materializar, de tão presente que se faz.

Elvira- Ah! Anda logo com esse molho. Tem torrada no armário. Vamos servir de entrada. Ela ainda vai tomar banho. Dá tempo.

(Já na sobremesa)

Felícia- Que delicia, esse mouse de maracujá! Você tem mãos de fada, Pedrinho! Benza Deus!

Pedro- E o almoço, Felícia? Foi do seu gosto?

Felícia- Adorei tudo! Quase tudo! O molho de lula estava pegando fogo, quase queimei a língua, mas estava gostoso. O peixe estava divino e a sobremesa então... de comer rezando! Que alegria estar aqui com vocês! Nem acredito! Já faz tanto tempo!

Pedro- Não faz nem um mês que você esteve aqui, Felicia!

Felíci- Pra mim parece uma eternidade! Por mim não desgrudava de vocês um só minuto!

(Pedro coça a palma e as costas das mãos)

Elvira- Vamos aproveitar bastante, mamãe. Afinal, um mês dá pra fazer muita coisa.

Felícia- Por isso, marquei minhas férias pro mesmo mês que as de vocês. Para passarmos bastante tempo juntos.

Pedro- Pois é, Felícia! É que nós marcamos uma viagem pra última semana de férias. Pra Cananéia. Temos uns amigos lá e...

Elvira- Pedro! Por favor! Depois falamos...

Felícia- Que maravilha! Eu adoro Cananéia! Vamos sim!

Pedro- Mas Felícia...

Felícia- Não se preocupem com a minha passagem! Eu pago! Funcionário público não ganha bem, mas eu sei economizar. E é tudo pra mim, mesmo.

Elvira- Vai ser um prazer viajar com você, mãe! E o Pedro tá adorando a idéia! Não é, amor?

Pedro- Nem me fale! (Coçando os braços vigorosamente)

Felícia- Quando acabarmos aqui, vamos ao shopping, comprar umas roupas de verão.
Vou comprar uma sunga pra você, fofo! E um biquini, pra minha filha.

Pedro- Não precisa gastar conosco!

Felícia- Eu quero gastar! Faço questão! Vou comprar umas roupas lindas pra mim!
Quero fazer bonito diante dos seus amigos, lá em Cananéia!

Pedro- (Coçando) Nossos amigos não ligam para aparências! Eles gostam de pessoas inteligentes e discretas, que não se intrometem na vida dos outros!

Felícia- Então eles vão me adoarar! Minha inteligência é notória! Mais discreta que eu, impossível!
Não suporto gente intrometida! E o bebê? Já incomendaram? Tá demorando, hein! Espero carregar meu neto no colo antes de morrer!

Elvira- Ainda é cedo, mãe! A gente só está casado há dois anos!

Felícia- Cedo? Vocês já estão com trinta anos! Vão esperar chegar aos quarenta? Na sua idade, eu já estava te buscando nas matinês! Que coisa! As mulheres de hoje em dia, estão tendo filhos cada vez mais tarde.
Acabam ficando velhas e buscando as crianças no pré. Não sou preconceituosa, mas acho estranho esses pais avós de hoje!

Pedro- Nós teremos filhos, quando estivermos com a situação financeira estável. Por enquanto, não!

Felícia- É, querido! Mas pra isso, você tem que correr atrás!

Pedro- Como assim?

Felícia- Veja bem! Minha filha é professora. Não vai conseguir mais do que já conquistou, mesmo. Sem chance! Mas você é um arquiteto de talento! Precisa se entrosar mais com gente do meio. Elvira me disse, que seu patrão sempre te convida pras festas e você nunca vai! Assim fica difícil de fazer contato!

Pedro- Os meus contatos, eu faço, através do meu trabalho! E não por meio de baladas e puxasaquismo.

Felícia- Um pouco de bajulação, não faz mal a ninguém. E um pouco de ambição, também!

Elvira- É verdade, Pedro! Você bem que podia ser uma pouco mais ambicioso!

Pedro- Até você, Elvira? (Pedro coça as costas enquanto fala). Minha ambição é do tamanho do meu sonho!
Eu sempre quis ter uma vida simples e confortável! Quero ter meu próprio escritório, sim. E terei!
Mas não quero ser rico, milionário! Quero viver bem, com dignidade e feliz! E a Elvira pensa como eu. Por isso, a gente se casou. Porque temos muito em comum. Mudou de ideia, Elvira?

Elvira- Você tem razão! A gente gosta da nossa vidinha, mamãe!

Felícia- Com cereteza, é uma vidinha! Vocês merecem muito mais. Mas se os dois estão felizes... Quem sou eu, pra criticar? Ainda mais, com um genro maravilhoso como este! Não me queixo, não! Tenho muita sorte por ter ganho este filho! Agradeço a Deus todos os dias...Nossa, Pedrinho! sempre que eu venho visitar vocês, te encontro neste estado lastimável, com essa coceira avassaladora! Parece até que é alérgico a mim!

Todos- HaHAHAHAHA!

Pedro- Felicia, você é hilária!

Felícia- Eu sei!

Elvira- Ah! O Pedro sempre teve esse problema, mamãe! É que esquecemos de comprar o anti alérgico dele. Daqui a pouco vou na farmácia comprar.

Pedro- Eu tomei o último comprimido, enquanto você colocava a mesa. Não tá fazendo efeito!
Acho que esta alergia é mais espiritual, que física.

Felícia- Nunca ouvi falar em alergia espirutual! Cada uma, Pedrinho! Só você, mesmo!

Elvira- Vou pegar o café! (vai pra cozinha).

Felícia- (Só, com Pedro) Ah! Eu tava tão cansada! Mas agora que estou aqui, com vocês, o cansaço até passou!

Pedro- Que bom, Felícia! (Se segurando para não se coçar)

Felícia- Sabe, Pedrinho?! Eu sempre quis ter um filho homem!

(Pedro coça o pescoço)

Felícia- Mas, Deus não quis. Tentamos, mas só a Elvira que veio! Adoro minha filha, mas era um sonho ter
um menino, pra dar o nome do meu marido, Raul. Pra comprar bola, colocar gravatinha e terninho de primeira comunhão. Acho que foi por isso, que me apeguei tanto a você. Queria tanto ter um garotinho! Mas, sabe? Quando dei a luz a minha Elvira, quando a enfermeira me entregou aquela coisinha com cara de joelho... Eu não aguentei! E pensei assim; "Meu Deus! Por que não é um menino?"

Pedro- (Não aguentando mais) Que história bonita, Felícia!

Felícia- Mas, enfim! A Elvira está aí e eu a criei com muito amor. Ela casou com você e eu ganhei o filho que tanto sonhei. Estou realizada.
Não sei se a Elvira te contou, mas fiquei muito tempo com depressão, depois que o Raul se foi. Nós éramos muito unidos. Sabe?! Unha e carne, mesmo. Nunca mais quis saber de ninguém. Só eu e minha filha neste mundo! Então, surgiu você, que levou ela de mim, mas que ganhou meu coração! Porque você faz minha Elvira feliz. E isto, é o que importa! O momento mais alegre da minha vida, é quando estou com vocês.
A vida vale a pena, assim! Vocês são a minha família! Não sei o que seria de mim sem vocês!

Pedro- (Parando de se coçar). Pôxa Felícia! Obrigado! Eu também gosto de você!

(Felícia fica esperando Pedro falar mais)

Pedro- O que foi Felicia?

Felícia- Você gosta de mim como uma...

Pedro- (Disfarçando) Quer ajuda, Elvira? (Pega a bandeja do café)

Felícia- Nossa! Como esse meu genro é tímido!

Elvira- Toma o café, mamãe! Tá quentinho!

Felícia- Humm! Você aprendeu a fazer café, também! Finalmente!

Elvira- Melhorou da coceira, meu bem?

Pedro- Estou melhor, sim!

Felícia- Que bom, Pedrinho!

Elvira- Mãe, este mês vai passar tão rápido! O tempo passa rápido quando a gente se diverte!

Pedro- Nem me diga!

Felícia- O mês vai passar voando, sim! Mas isto não é problema.

Elvira- Como assim? Não entendi!

Felícia- Essa é outra surpresa que eu tenho pra vocês!

Elvira- Surpresa? Que surpresa, mamãe?

Felícia- Depois das férias, eu vou, mas volto!

(Pedro volta a se coçar)

Elvira- Fala de uma vez, mãe!

Felícia- É o seguinte, depois das férias, eu volto pra minha cidade, fico uma semana em casa,
resolvo algumas pendências, assino uns papeis e volto pra cá!

Elvira- Volta? Por que?

Felícia- Como funcionária pública, eu tenho direito a licença sem vencimento. E como economizei muito dinheiro e estou muito cansada de tanto trabalhar, resolvi tirar essa licença, uma semana depois das férias. E adivinha? Vou ficar mais um ano com vocês! Não é o máximo?

(Pedro se coça desesperadamente)

Elvira- Que bom, mãe! (Preocupada com Pedro)

Felícia- E o melhor ainda estar por vir!

Elvira- Não me diga que tem mais?

(Pedro começa a inchar e Elvira não percebe)

Felícia- Vou me aposentar daqui a quatro anos e venho morar com vocês definitivamente. Não é a glória?

(Pedro cai duro no chão)

Elvira- Pedro!

Felícia- Meu genro!

Elvira- Fica olhando ele mamãe! (Corre pro telefone) Uma ambulância, urgente!

(Enquanto isso, Felícia faz respiração boca a boca no genro)

(to be continued...)

domingo, 11 de dezembro de 2011

FÉRIAS EM FAMÍLIA de Kadu Veríssimo

(tema férias)

Personagens

Cleuza ( a Mãe)
Patrício ( o Pai)
Jurema ( a filha)
Sandro (filho)

 (todos estão dentro do carro, prontos para viajar, Patrício e Cleuza estão felizes, o carro esta cheios de malas)

Cleuza
Vamos lá, apertem os cintos crianças, que finalmente vamos viajar né amor?

Patrício
Não to nem acreditando Cleuza, depois de anos sem conseguir tirar umas férias decente nós vamos  viajar juntos, dá um beijo aqui...(beija a esposa)

Cleuza
Tô que não me agüento de alegria, estão felizes crianças?

(silêncio)

Cleuza
Tem alguém aí ?

Sandro
Que que é mãe?

Cleuza
Como assim que que é mãe? Você não escutou eu e seu pai falando com vocês?

Sandro
Escutei e daí?

Cleuza
E daí que quando alguém fala com você , você tem que responder, parece que não tem educação...

Jurema
Foi a educação que recebemos dos nossos pais...

Cleuza
Ta querendo me enfrentar Jurema, vai começar?

Patrício
Não, não, não...não deixa nada estragar nossa alegria meu amor, essa é a nossa tão planejada férias...

Cleuza
Pode deixar meu bombom, eles não vão conseguir me tirar do sério, eu estou tão feliz, mas tão feliz, que vou fingir que nem escutei nada ... mas na volta...ah, na volta a gente vai ter uma conversinha...vamos lá Patrício, vamos embora...

(o carro anda)

Patrício
Trouxe o mapa?

Cleuza
Não

Patrício
Você não trouxe o mapa? (para o carro)

Cleuza
Mas porque você não trouxe, eu que tenho que pegar tudo? Eu que tenho sempre lembrar de tudo?

Jurema
A sra não deixa ninguém fazer nada, quer sempre fazer tudo...

Cleuza
Vocês que são uns preguiçosos e nunca fazem nada, você não tem a capacidade de lavar as suas calcinhas Jurema...

Jurema
Quem lava é a máquina

Cleuza
E quem põe a roupa lá, me diz? Quem joga aquela sua calcinha podre la dentro e joga sabão amaciante...quem? me diz? Só se for os bichos que levam de tanta sujeira que tem naquela calcinha...

Jurema
Saco, inferno de viagem...

Cleuza
Como é que é?

Patrício
Vamos sem mapa mesmo...

Cleuza
A próxima vez que você blasfemar jurema, eu taco a mão na sua boca...

Sandro
E vai presa, sabia que não pode bater em criança?

Cleuza
Que criança? Vocês não são mais crianças a muito tempo...eram tão bonitinhos quando crianças né Patrício, agora são esses monstros...se pudesse pular dos doze pros vinte anos de uma vez...

Patrício
Vamos mudar de assunto, vamos...estamos indo pra praia, de férias, pra relaxar, curtir...

Jurema
Super curtição, ir na praia com o meu pai e minha mãe

Cleuza
Eu quero te matar garota, para de reclamar...

Sandro
Ah mãe, é verdade, se a gente não é mais criança porque a gente não pode viajar sozinho? Tem que ir sempre com vocês?

Cleuza
O dia que você tiver o seu dinheiro você viaja sozinho, mas enquanto morar debaixo do meu teto, vai viajar comigo...

Sandro
Mas o pai do Camargo deixa ele viajar com os amigos...

Cleuza
Mas eles são uns libertinos...

Patrício
E a família dele tem dinheiro...

Jurema
E a gente é pobre

Cleuza
Pobre é você, pobre de espírito, espírito de porco...mal agradecida....não sei a quem essa menina puxou....

Patrício
Seu pai trabalha muito pra poder te dar essa viagem minha filha, é com muito esforço...

Jurema
Jogando dinheiro no lixo, eu não queria ir...

Patrício
Poxa filha, não fala assim você não é mal educada...

Cleuza
São as companhias, desde que ela começou a andar com a Regininha ela ta assim achando que tem o rei na barriga, mas eu trato de colocar ela no lugar dela...

Sandro
Pai, põe um som...

(o Pai liga o som)

Jurema
Aff , vai deixar na rádio...

Patrício
Ta quebrado o cd player

Cleuza
Mas quebrou de novo? De novo Patrício?

Patrício
É ué...quebrou...

Jurema
Então desliga...

Cleuza
Deixa aí eu gosto dessa música

Jurema
Música de velha

Cleuza
Música com letra, com poesia, não esse lixo que você escuta....

Sandro
Nossa mãe que bizarro, tira essa rádio...

Cleuza
Ta bom...

Jurema
Se ele pede você tira né? Agora seu eu peço ...

Cleuza
Não começa...

Jurema
A sra me odeia...

Cleuza
Para com isso Jurema...

Jurema
Me odeia...

Cleuza
Para de falar bobagem Jurema

Jurema
Me odeia demais, só pode...

Cleuza
Chega Jurema, chega...sua voz já ta me irritando, desliga esse rádio Patrício

Patrício
É hoje...

Cleuza
Ta resmungando o que?

Patrício
Nada...

Cleuza
Fácil resmungar quando chega em casa do trabalho a noite, e tem comida quente e criança criada...

Patrício
Não vai estragar nossas férias tão planejada Cleuza...

Cleuza
Eu? Jamais... esperei muito por essas férias, economizei o que podia, e nada vai estragar...nada...

(toca o celular) (Cleuza vê quem é, faz cara de desgosto e joga o celular dentro da bolsa)

Patrício
Quem era?

Cleuza
Sua mãe

Patrício
Atende...

Cleuza
Não, ela vai estragar nossa viagem

Patrício
Atende Cleuza, pode ter acontecido alguma coisa...

Cleuza
Que coisa? Morrer ela não morreu se não ela não ligaria...

(o celular continua tocando)

Jurema
Nossa a vovó insiste...que chata

Patrício
Respeita sua vó...atende logo Cleuza

Cleuza
Atende Sandro, fala que estamos ocupados sei lá, inventa alguma coisa

(Sandro pega o celular)

Sandro
Oi vó...não o pai não dá pra atender , ta dirigindo...e minha mãe não quis falar com a sra...

Cleuza
Ta louco menino...

Sandro
É sim vó...ela não vai gostar de ouvir isso que a sra falou não...

Cleuza
Me dá isso aqui...oi , oi Dona Claudia , não, é que o celular tava na minha bolsa que estava ....imagina...imagina que eu não ia querer falar com a sra....não precisa chorar por causa disso, esse Sandro é um mentiroso idiota

Sandro
O que?

Cleuza
Sem drama né Cláudia? Sem drama...já bebeu né...de novo....olha agora não vai dar pra falar tá...muito barulho...(faz som de chiado) vamos entrar no túnel depois a sra...(desliga) velha chata e bêbada...

Patrício
Mas respeito com a minha mãe...eu não falo que a sua é uma gorda fedorenta...

Cleuza
Você ta louco....você ta louco...(mete um tapa na cara de Patrício que perde o controle no carro)

Jurema
Meu Deus, cuidado...

(todos gritam)

Cleuza
Joga no acostamento...

Patrício
Eu perdi o freio

Jurema
Vamos morrer....

Sandro
Culpa da mamãe...

Cleuza
Eu devia ter abortado vocês...

Jurema
Cuidado papai, a árvore...

Patrício
Eu não tenho controle...

Cleuza
Minhas férias planejadas...olha o caminhão cuidado...

Sandro
Meu Deus... o precípicio...

(todos Gritam)
(black-out)

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

MALA SEM ALÇA por Marcus Di Bello

TEMA: FÉRIAS

(Quarto de um casal. Uma mala aberta em cima da cama. Roupas espalhadas. Renato está impaciente)

RENATO
Vamos logo, meu amor, vamos perder o nosso vôo.

CLARISSA
(Aparece segurando algumas roupas)
Não me apressa. Estou fazendo as malas. Quer que eu vá sem roupa pra Nova York?

RENATO
Faz duas horas que você está fazendo essa mala. Daqui a pouco não conseguiremos ir.

CLARISSA
Eu não tenho roupa, amor. Como vou pra Nova York desse jeito?

RENATO
Como você não tem roupa? Olha pra essa bagunça!

CLARISSA
Estou tentando fazer a mala, não é isso que você quer? Olha só, não tenho nenhuma roupa de frio, como vou agüentar as férias inteiras se não estiver bem protegida do forte frio que faz?

RENATO
Como não tem roupa de frio? Semana passada você comprou cinco casacos!

CLARISSA
Mas os que eu comprei não servem.

RENATO
Mas você comprou justamente pra levar.

CLARISSA
Fica quieto, isso é coisa de mulher, deixa que eu me entendo com o meu guarda-roupa.

RENATO
Então compra tudo lá em Nova York, pronto. Fecha a mala e vamos, pelo amor de Deus.

CLARISSA
De jeito nenhum, eu sei que tenho roupa por aqui, eu só preciso encontrar.

RENATO
Clarissa, por favor...
(Senta na cama. Foco em Clarissa)

CLARISSA
(Começa música de fundo. Clarissa canta)
Eu só preciso de
Roupa p’ra eu levar
Que seja bem bonita
Na mala eu vou botar

Quero roupa assim
Que mostre o meu brilho
Um sapato alto, um vestido
Uma saia e um espartilho

Só quero ir bem
Com a mala preparada
Mas não acho minhas roupas
Roubaram, foi a empregada

Férias em New York
Tem que ser especial
É um destino badalado
É uma cidade mundial

Me dê tempo pra escolher
Por favor, não me assola
Não sei o que levar

RENATO
Que tal uma camisola?

(Fim da música)

CLARISSA
Camisola?

RENATO
É. Já está tarde, perdemos o vôo. Coloca a camisola e vai pra cama. Eu vou pra sala ver TV.
(Sai)

CLARISSA
(Com um telefone)
Alô? Mãe? Não, mãe, desmarcamos a viagem para Nova York. Pois é, mãe. Acho que no fim de semana a gente passa aí. Claro, mãe, foi ideia do Renato passar aí na senhora. Está bem, beijo.
(Desliga)
Ah, agora ele não tem desculpa para não passar as férias com mamãe.

(Fade-out)

domingo, 4 de dezembro de 2011

O Penúltimo Capítulo de Regina Célia Vieira

Tema:  Novela
Personagens:
Janete- mãe
Alfredo- pai
Godô- 16 anos
Helô- 14 anos
Dagô- 13 anos


Janete- O jantar está servido!
Dagô- Mas já? Ainda não são nem seis horas!
Helô- Eu não tô com fome, não, mãe! Vou comer depois!
Janete- Aqui ninguém come depois! Vai lá, Dagô! Chama teu pai, senão vai esfriar! Esqueceram que hoje é o penúltimo capitulo da novela das sete? A gente tem que comer mais cedo, lavar a louça pra assistir a novela desde o começo! Não perco nem os comerciais, hoje!
Godô- Ai, mãe! A senhora e essa mania de ver o penúltimo capitulo das novelas! Não assiste o ano inteiro e quer ver o penúltimo capítulo!  Pra que?
Janete- Vocês estão cansados de saber, que eu assisto o primeiro e o segundo capítulo pra conhecer os principais personagens, o quadragésimo e o quinquagésimo pra saber há quantas anda a trama e o penúltimo pra ver como tudo vai acabar.
Godô- E por que não vê o último de uma vez?
Janete- No ultimo capitulo não acontece nada. Tudo o que tem pra acontecer,  acontece no penúltimo. E novela é uma enrolação danada. Assistindo aos principais capítulos, você já sabe da história toda. E andem logo que a hora tá passando!
Alfredo- Janete! Eu lanchei ás quatro! Comida agora, não entra!
Janete- Come uma salada, então!  E mais tarde, se der fome, come um sanduiche.  Mas jantar, é só agora. Não quero ninguém jantando fora da mesa.
(Todos se dirigem a mesa)
Janete-  E vamos comer rápido, que ainda tem a louça pra lavar. E é você quem lava hoje, Helô! E o Godô, seca!  Basta eu fazer toda a comida!  Já são cinco para as seis!  E é pra lamber o prato, Dagô!
Dagô- Me dê um bom motivo pra que eu faça isso!
Janete- Uma cinta bem grossa, é um bom motivo pra você?
(Dagô enfia comida na boca.)

Alfredo- Você estressa todo mundo com essa historia de penúltimo capítulo! Nunca vi coisa igual!
Janete- Eu não sou uma mulher igual ás outras! Você já devia saber disso!
Helô- Realmente! O fato da mamãe querer assistir só ao penúltimo capítulo das novelas, faz dela uma mulher muito especial, mesmo!
Todos- Há! Há! Há! Há! Há!
Janete- A cinta grossa, também pode esperar por você Helô!
(Helô se cala.)
Alfredo-Que humor, hein, querida!
Janete- Come tua salada e sossega!
(Alfredo manda ver na salada.)
(Todos comem ruidosamente, menos Godô.)
Janete- Godô! Você tem que comer, meu filho!  A comida está gostosa! Não podemos te esperar, não!
Godô-  Eu não vou comer! Vou entrar na internet! Preciso mandar uns e-mails! Com licença!
Janete- Senta, Godô! Eu não mandei você se levantar!
Gogô- Eu preciso mandar uns e-mails...
Janete- Senta!
Godô-  Eu não vou fazer o que  a senhora quer! Eu não sou obrigado a comer correndo e sem ter fome, só porque a senhora não pode perder o penúltimo capítulo de uma novela, que nem sequer tem audiência direito!
Alfredo- Senta filho! Não contraria a tua mãe!
Janete- Deixa comigo, Alfredo! Desde quando o senhor questiona as minhas ordens?
Godô- Desde que eu cresci e não sou obrigado a compartilhar das suas neuroses!
Janete- Você está me chamando de neurótica? Alfredo faz alguma coisa!
Alfredo- Senta filho! Não contraria a tua mãe!
Janete- Isso é culpa sua Alfredo! Você vive passando a mão na cabeça desses meninos! Taí a falta de respeito!
Godô- Perdão mãe, mas a gente não pode fazer sempre,  tudo o que a senhora quer! Não é justo! Eu não quero comer e não vou comer!
Janete – Você vai, sim! Eu não vou perder o capitulo da novela por sua causa! O penúltimo capitulo não reprisa! Se perder, tá perdido!
Godô- Pois então não perca! Eu é que não quero assistir. Nem gosto de novela!
Janete- Eu não quero que você assista a novela. Eu quero é que você jante! Aqui todos comem juntos á mesa. Sempre foi assim e assim será!
Godô- Mas, mãe...
Janete- Senta!
(Godô não se senta. Silêncio constrangedor.)
Janete- Tô esperando, Godô!
Alfredo- Senta filho! Não contraria a tua mãe!
Janete- Chega, Alfredo!
Alfredo- Mas você quer que eu tome alguma atitude e quando eu tomo,  você me manda ficar quieto?
Janete- Atitude é uma coisa, ficar repetindo a mesma frase que nem um papagaio, é outra!
Alfredo- Você quer que eu bata no meu filho?
Janete- Eu queria que você tivesse educado melhor o seu filho! Mas não! O primogênito! Homem! Você só queria saber de brincar com ele, levar pro futebol!  Eu é que ajudava com a lição de casa, que dava as broncas e as palmadas. Eu sempre a má. Você sempre o bonzinho! Agora, eu peço pra ele fazer, uma vez na vida, a minha vontade e comer na mesa com a família... E ele vem com má criação! O senhor, ao invés de me apoiar, fica só repetindo;  “Não contraria a  tua mãe! Não contaria a tua mãe”. E eu sou louca, pra não ser contrariada, Alfredo? É isso que você quer dizer, Alfredo? Que eu sou louca e não posso ser contrariada? É isso, Alfredo?
Alfredo- Não era isso! Mas pensando bem...
Janete- Pare de ser debochado, Alfredo! Estou cansada do seu sarcasmo!
Alfredo- Por que você faz tanto drama por nada?  Parece até esses personagens de novela que você nem acompanha direito! Já pensou se acompanhasse! Já teria acabado comigo, como fazem essas psicopatas doidas! Me trata sem respeito nenhum! Como se eu fosse um idiota!
Janete- Depois eu é que faço drama! Você é um idiota, Alfredo! Queria que eu te tratasse como?
Alfredo- Você bem que podia me respeitar! Pelo menos na frente das crianças!
Helô- Deixa, pai! Eu sei que o senhor não é um idiota!
Alfredo- Eu não vou aguentar mais os seus desmandos! Você é muito egoísta, Janete! Só pensa em você...
Helô- Para, pai!
Janete- Eu só penso em mim? Trabalho que nem uma condenada! Quando chego, ainda tenho que preparar o jantar pra todo mundo! Dar um jeito na casa. E ainda trago trabalho do escritório. Você trabalha em casa, naquele computador o dia inteiro. Pode se levantar e comer o seu lanchinho das quatro. Faz o que gosta, o que escolheu como profissão. Quero só descansar de um trabalho chato e burocrático e assistir ao penúltimo capítulo inteiro da novela com a minha família, sossegada. Eu quero ganhar o bolão dessa vez! Eu tenho que ganhar dos meus colegas do escritório pelo menos uma vez! Eu quero ter assunto pra conversar com eles, amanhã! Isto faz de mim uma pessoa egoísta?  Mas eu mereço,  mesmo, ouvir isso! Quem manda ser trouxa?
Helô- Para, mãe!
Alfredo-  Eu reconheço que você faz muito por nós. Mas tudo precisa ser levado a ferro e fogo?  Você não relaxa! Tá sempre pilhada! Calma! Qualquer dia você tem um troço!
Janete-  É pra isso que você torce! Não é, Alfredo? Pra que eu tenha um troço! Pra você e seus filhos se verem livres de mim! Sim!  Porque todo mundo aqui me detesta! Adoram o pai, mas detestam a mãe! A mãe é a chata! A mãe é a víbora, a mãe não dá carinho...
Dagô- Eu adoro você, mamãe!
Janete- Cala a boca, Dagô! Eu sempre fui uma mãe compreensiva, uma mãe zelosa, amiga. Uma esposa correta, companheira. O que mais você querem de mim? Cadê o Godô?
Helô- Ele aproveitou a briga de vocês e foi pro quarto! Eu posso ir pro meu quarto, também? Eu já acabei de comer?
Janete- (Esgotada)- Você tem que lavar a louça... Ah! Vai! Pode ir ver seus desenhos! Mas depois vem lavar a louça.
(Helô sai.)
Dagô- Eu quero ver desenho, também!  Comi tudo!
Janete- Vai!  E fala pro Godô não esquecer de secar a louça quando a Helô for lavar.
(Dagô sai.)
Alfredo- Nós precisamos conversar!
Janete- Fala rápido que a novela já vai começar!
Alfredo- Eu quero o divórcio!
(Janete fica muda.)
Alfredo- Janete você me ouviu? Eu quero o divórcio. Já faz tempo que eu venho pensando nisso. Nosso relacionamento já esta desgastado há muito tempo! Como agora nossos filhos já estão crescidos, não vejo porque continuarmos juntos. É melhor cada um ir pro seu lado, antes que nos magoemos mais.
Janete- Foi a Tatiana!
Alfredo- Quê?
Janete- Foi a Tatiana que matou o Juliano Beltrão! Eu apostei no bolão da firma! Vai passar hoje na novela!
Alfredo- Janete! Você ouviu o que eu disse, Janete? Você ouviu, sim! Não se faz de louca, não!
Janete- Tudo o que tem pra acontecer, acontece no penúltimo capítulo! O penúltimo capítulo não reprisa! Se perder, tá perdido!
Alfredo- Claro! Você quer assistir ao penúltimo capítulo da novela! Tudo bem! Amanhã a gente conversa melhor! Ou mais tarde se você estiver mais disposta! Eu vou estar no quarto de empregada assistindo ao futebol!  Não podemos mais adiar essa conversa, Janete! Até!
(Janete tira a mesa. Lava e seca a louça. Dá um jeito na casa. Senta em frente a tv. A novela começa. Janete desliga a tv , baixa a cabeça e chora. )