sexta-feira, 28 de outubro de 2011

"A NOITE DA MADONNA", de Junior Texaco.



Tema: Madonna
Personagens:  Walter, o pai.
                           Geraldinho, o filho.

(Walter está na sala assistindo TV, e toma um susto ao entrar Geraldinho pronto pra sair. )

Walter – Mas o que é isso menino? Carnaval está longe ainda. Tira isso, que coisa feia!
Geraldinho – Que que tem? Vou sair. Estou até bem básico.
Walter – Olha aqui, na rua assim você não sai. Pode ter certeza porque eu não deixo, ouviu? Não deixo!
Geraldinho – Ah, vou sim pai. Hoje é a noite da Madonna, na boate. As bichas estão me esperando, não começa! O senhor disse que me aceitava papai.
Walter – Aceitar você vestido desse jeito é que não, onde já se viu? E pode ir tirando essa roupa senão te arranco na base da porrada! Anda Geraldinho não me provoca! Garoto mau caráter!
Geraldinho – Não tiro não, tá pensando o que? Esse modelo eu mesmo que fiz. Tive que usar muita criatividade, né, porque a mesada que o senhor me dá é uma vergonha.
Walter – Pois olha, vou te dizer, esse esforço não adiantou muito não, viu? Se a Madonna te visse agora ia ser uma desgraça.
Geraldinho – Olha aqui pai, não começa. O senhor disse que me aceitava, é ou não é?
Walter – É…
Geraldinho – Que gostava de mim do jeito que eu sou…
Walter – É…
Geraldinho – Que não ligava para as minhas amizades…
Walter – Humm…é.
Geraldinho – Que não ligava nem que eu fumasse maconha…
Walter – Epa, ah, isso eu não disse não.
Geraldinho – Pois é, mas das minhas roupas não falou nada. E agora vem com estória.
Walter – Vem com estória não que eu nem sabia que você tinha virado travesti. Cada dia é uma novidade meu Deus.
Geraldinho – Drag papai, sou uma Drag.
Walter – Drag ainda por cima! Meu filho, escuta o papai. Olha, Drag é uma vergonha, é menos que travesti, não faz isso não…
Geraldinho – Chega papai estou atrasado. A Lucimara, a Katia e a Rose estão me esperando.
Walter - Quem? Essas amigas suas não conheço…
Geraldinho – A Lucimara é o Luiz papai. E o Kadu é a Katia e a Rose também, que ele tem dupla personalidade.
Walter – Meu pai eterno, parece que eu estou vivendo num daqueles episódios do ‘além  da imaginação’. Olha aqui moleque sem vergonha, vai já tirar essa roupa e pronto! Assim você não vai.
Geraldinho – Não, não e não. Assim sou e assim eu vou.
Walter – Peraí  que eu já te pego! (e passa a mão num chinelo)
Geraldinho – Isso, me bate papai! Me espanca! Mostra sua cara! Dê seu exemplo de intolerância papaizinho querido, vai!
Walter – Deixa de ser imbecil, moleque maluco dos infernos! Eu só quero que você tome vergonha na cara , deixe de andar como uma bichinha desclassificada e seja um gay homem pelo amor de Deus! Vai já tirar essa roupa senão não respondo por mim!
Geraldinho – Mas papai, eu já disse. Hoje é a noite da Madonna na boate. É uma festa em homenagem a ela.
Walter – Coitada. Deve estar se revirando no tumulo.
Geraldinho – Tá louco pai? A Madonna não morreu.
Walter – Não morreu porque não te viu. Senão ia ter um troço, coitada! A mulher passa a vida se dedicando à carreira tentando passar uma mensagem positiva através da sua musica e o que acontece senhoras e senhores? (…) Atrai um bando de viadinho fubá com uma maquiagem igual a do Bozo e dizendo que querem ser como ela. E o pior, sem entender picas do que a coitada canta. O que se prova pelo tipo de comportamento que essas criaturas têm.
Geraldinho – Que que é isso papai? Está me chamando de burro?
Walter – Estou te chamando de viadinho burro, Geraldinho.
Geraldinho – Você vai ver papai, vou ser famosa! Rica! Vou fazer shows no exterior! Na Europa!
Walter – Quem faz show na Europa é travesti Geraldinho! Travesti! E olha, só se tiver samba no pé e pagar uma comissão pra Sonia Macaca, que travesti na Europa não é bagunça, não.
Geraldinho – Ah, me deixa papai! Você não entende. Me deixa ir que eu já estou atrasado, senão chego tarde pro concurso.
Walter – Concurso?
Geraldinho – É pai. De bate-cabelo. Dublando a Madonna.
Walter – Nunca! Isso nunca! Filho meu batendo o cabelo na boate. Era só o que me faltava, onde já se viu? Vai acabar dando problema no pescoço, ficar tetraplégico. Deu no fantástico.
Geraldinho – Mas papai quem ganhar o concurso vai até Londres, conhecer a Madonna.
Walter – Mas nem se fosse pra conhecer a Tina Turner! Drag não! Não, não e não. Ene A Ó Til!
 Geraldinho – Vou me vingar papai, você não compreende minha essência feminina. Minha feminilidade.  Você me humilhou, riu de mim, zombou do meu modelo, vai pagar caro. Vai ser briga de foice papai!
Walter – Filho, não faz assim, estou sendo bem bacana com você, olha, te empresto minha camiseta da Madonna, aquela que tem a estampa do Erótica. É só pôr um jeans, tirar essa peruca fedida, essa maquiagem do Bozo, pôr um tênis e você vai ficar lindão, te empresto até meu perfume.
Geraldinho – Não quero. Quero ir assim.
Walter – Se for arrumadinho como eu falei é capaz até de arrumar um paquera, um namoradinho, legal, de família.
Geraldinho – Não quero caralho! Quero ir assim papai. O concurso…
Walter – Não tem concurso nem mané concurso. Desse jeito você não sai de casa. Vai me matar de vergonha. E a vizinhança vai dizer o que? Assim não vai. Só se for por cima do meu cadáver!
Geraldinho – Não brinque comigo papai.
Walter – Não brinque comigo você moleque maluco dos infernos! Bicha retardada, vai pro teu quarto já, anda! Não sai. Assim você não sai.
Geraldinho – Eu vou papai. Vou mas volto. Pra me vingar.
(um estouro, uma fumaça e o menino sumiu)
Walter – A gente faz de tudo pra aceitar um filho gay, mas tem certas coisas que o bom senso não aceita…filho gay, vai vendo, um dia você também vai ter um.  

                                                                Blackout

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